Europa corre risco na disputa das stablecoins
Um conselheiro do Banco Central Europeu (BCE) levantou um ponto importante sobre a soberania monetária da Europa. Ele alertou que as stablecoins lastreadas no euro representam apenas 0,15% do mercado global de stablecoins, que está avaliado em incríveis 230 bilhões de dólares. Essa menor participação pode impactar a estabilidade financeira e a autonomia política do continente.
Em um artigo publicado no blog do BCE, Jürgen Schaaf destacou que as stablecoins estão mudando as finanças internacionais. A disparidade entre o euro e o dólar é um sinal claro de que a Europa enfrenta um grande desafio. Atualmente, coins atrelados ao dólar, como Tether (USDT) e USDC (da Circle), dominam 99% do mercado, enquanto as opções em euro somam menos de 350 milhões de euros.
Schaaf enfatizou que uma adoção massiva de stablecoins em dólar pode prejudicar o controle do BCE sobre a política monetária. Isso poderia criar um cenário semelhante a economias que já utilizam o dólar como padrão, onde a moeda local perde espaço para alternativas estrangeiras.
Stablecoins em dólar ameaçam o controle financeiro na Europa
O conselheiro do BCE descreveu várias maneiras pelas quais as stablecoins em dólar podem comprometer o controle monetário europeu. Uma delas é a possibilidade de serem incorporadas em sistemas de pagamento tradicionais, por exemplo, através de grandes empresas como Visa e Mastercard. Além disso, varejistas gigantes, como Walmart e Amazon, estão considerando usar essas moedas em transações de grande volume, o que poderia desviar fluxos significativos de pagamentos da estrutura bancária tradicional.
Uma preocupação adicional de Schaaf é com stablecoins que oferecem juros, pois essas podem atrair depósitos que atualmente estão nos bancos europeus. Isso é preocupante, porque os bancos desempenham um papel essencial na economia local, dependendo fortemente de depósitos para suas operações.
Outro aspecto que merece atenção é o uso das stablecoins para liquidações. Elas se tornaram populares em negociações de finanças descentralizadas (DeFi), exchanges e pagamentos internacionais, graças à sua velocidade e ampla aceitação.
Europa entra na disputa pelo mercado de stablecoins
Schaaf alerta que se as stablecoins em dólar consolidarem sua posição no setor de liquidações tokenizadas, as alternativas europeias podem ter dificuldades para se destacar. Isso ocorre devido ao efeito de rede e à escala exigida por sistemas digitais.
Ele também ressaltou que os EUA deixaram claro que o suporte às stablecoins vai além da inovação: é uma forma de reafirmar a dominância do dólar no palco global. Em resposta, o projeto do euro digital está sendo visto como uma forma de proteger a soberania monetária da Europa, funcionando dentro de uma estratégia mais ampla de pagamentos digitais no continente.
Algumas iniciativas já estão surgindo, como o EURAU, uma stablecoin desenvolvida pelo Deutsche Bank, Galaxy Digital e Flow Traders. Embora seja considerada a primeira token em euro que atende às regulamentações do MiCA, seu impacto ainda é pequeno se comparado à dimensão do mercado atual.
Visões globais em disputa sobre o futuro do dinheiro
Esse desafio europeu em relação às stablecoins é parte de uma disputa global. Muitos países já reconhecem que moedas digitais podem reformular as estruturas de poder monetário, moldadas ao longo de anos. Enquanto a Europa aposta em uma supervisão rigorosa com o MiCA, os Estados Unidos adotaram uma abordagem mais liberal, como evidenciado pelo recente GENIUS Act, que fortalece a posição do dólar.
A China não ficou para trás nessa corrida: o ex-vice-ministro das Finanças, Zhu Guangyao, sugeriu a inclusão de stablecoins atreladas ao yuan na estrutura financeira nacional, visando conter a dominância monetária dos EUA. Outros países asiáticos também estão se movendo rapidamente. A Coreia do Sul anunciou uma legislação para permitir a emissão interna de stablecoins, enquanto Hong Kong implementará regras abrangentes em breve.
A disputa vai além da simples fatia de mercado. O controle da infraestrutura que sustentará o comércio global do futuro está em jogo. O Fundo Monetário Internacional (FMI) expressou suas preocupações com a falta de consenso sobre o tratamento das stablecoins, seja como moedas ou ativos financeiros.
Assim, o futuro ainda é incerto para a Europa, que enfrenta desafios significativos para se igualar aos EUA, considerando as vantagens que já existem no ecossistema de pagamentos digitais.