Novo projeto de lei sugere regras para criptomoedas sem entendimento
No dia 8 de julho de 2025, o senador Fabiano Contarato, do Espírito Santo, apresentou um projeto de lei que visa incluir um novo artigo no Código de Processo Penal. O objetivo é permitir que delegados de polícia possam, por conta própria e de forma cautelar, bloquear imediatamente valores, bens e ativos financeiros quando houver suspeitas de estelionato envolvendo fraudes eletrônicas ou em aplicações financeiras.
O senador justifica essa proposta dizendo que existe uma lacuna que atrapalha a eficácia das investigações em crimes financeiros digitais. Ele acredita que a necessidade de uma autorização judicial prévia para essas ações é um obstáculo para impedir que os ativos sejam rapidamente transferidos, convertidos em criptomoedas ou levados para fora do país.
Com essa mudança, quando houver evidências razoáveis de atividades fraudulentas, o delegado poderia agir rapidamente, registrando a decisão por escrito e após uma supervisão judicial.
É importante mencionar que, apesar da proposta ter suas intenções, há preocupações quanto às garantias fundamentais e ao respeito ao devido processo legal. Essa mudança pode comprometer princípios que sustentam o sistema jurídico, como a imparcialidade e o direito a um julgamento justo.
Além disso, há uma preocupação persistente sobre a maneira como ativos virtuais são frequentemente considerados apenas como ferramentas para a criminalidade. Essa visão reduz, e de forma equivocada, a complexidade e as potencialidades das tecnologias em questão. O projeto sugere que o bloqueio só pode ocorrer quando há conversão de valores em criptomoedas ou suas transferências para outros países, criando um foco seletivo que ignora outras realidades do processo penal.
Vale lembrar que, assim como qualquer outra forma de dinheiro ou instrumento financeiro, os ativos virtuais podem, eventualmente, ser usados para fins ilícitos. Contudo, isso não justifica tratá-los como vilões em um cenário criminal. Dinheiro em espécie e sistemas bancários também podem ser usados para fraudes, mas não são demonizados dessa maneira.
A alegada “lacuna” que o senador menciona parece mais uma falta de entendimento sobre como a tecnologia das criptomoedas realmente funciona. As blockchains, como as do Bitcoin e Ethereum, são transparentes, permanentes e rastreáveis, permitindo um registro mais claro e preciso do que muitos sistemas bancários tradicionais.
As dificuldades para bloquear ativos virtuais não surgem de uma legislação insuficiente, mas sim da natureza dessas plataformas, muitas das quais não possuem custódia dos ativos. Isso significa que, nas corretoras descentralizadas, não há como forçar um bloqueio direto. Já as corretoras brasileiras seguem regulamentações e colaboram quando necessário, enquanto as corretoras internacionais dependem de cooperação jurídica.
Nos casos em que o usuário é quem controla os ativos — como no armazenamento próprio, onde apenas ele tem acesso à chave privada —, não há como obrigar alguém a realizar um bloqueio. Além disso, o detentor dessa chave não é obrigado a revelá-la em investigações, já que isso poderia infringir seu direito à não autoincriminação.
Portanto, o que realmente precisa de atenção aqui não é a tecnologia em si, mas a falta de conhecimento de muitos profissionais do Direito sobre como esse ecossistema funciona. Más propostas de legislações cometerão erros ao atribuir à tecnologia uma presunção de ilegalidade, deixando de lado as enormes oportunidades e aplicações legítimas que esses ativos oferecem.
Um ambiente normativo mais alinhado às realidades dos ativos virtuais não só exige entendimento técnico, mas também um bom diálogo entre todos os envolvidos no setor. É necessário buscar soluções que sejam realmente eficazes e que respeitem as garantias constitucionais, sem simplificações ou estigmas que limitam o potencial dessa nova realidade econômica.