A aposta que se tornou referência mundial
Em 11 de agosto de 2020, a empresa de software que antes se chamava MicroStrategy deu um passo significativo: a primeira compra de Bitcoin. Essa decisão inicial mudaria completamente a trajetória da empresa. Hoje, após cinco anos, agora sob o nome de Strategy, a empresa é uma referência em BTC, sendo a maior detentora de Bitcoin entre as corporações e à frente do movimento conhecido como Bitcoin Treasuries Companies.
Esse movimento começou em um momento complicado da história recente, durante a pandemia de Covid-19. Com o fechamento das economias, o impacto foi profundo, resultando em uma queda de 5,2% no PIB mundial, conforme relatado pelo Banco Mundial. Para enfrentar esses desafios, governos lançaram medidas de estímulo como a redução das taxas de juros, aumento da dívida pública e expansão da base monetária, levando a um aumento drástico nas emissões de moeda.
Nos Estados Unidos, por exemplo, a oferta monetária, medida pelo M2, saltou de US$ 15,4 trilhões em fevereiro de 2020 para US$ 17,8 trilhões em maio. Para dar uma ideia, esse aumento de US$ 2,4 trilhões ficou muito acima do que ocorreu durante a crise do subprime, quando a expansão foi de apenas US$ 1 trilhão em 18 meses. E tudo isso resultou em um alerta: o risco de inflação.
Frente a esse quadro instável, Michael Saylor, presidente da Strategy, começou a digitalizar a empresa e cortou despesas, economizando US$ 5 milhões inicialmente. Mas logo surgiu a necessidade de preservar esse capital em meio a um dólar que ele descreveu como “um cubo de gelo derretendo” devido à impressão de moeda.
As opções consideradas incluem ações, títulos, imóveis e até mesmo riquezas tradicionais, como o ouro. Entretanto, ao se aprofundar no estudo sobre Bitcoin, especialmente influenciado pelo livro “O Padrão Bitcoin”, Saylor encontrou uma solução que ia além da simples valorização: Bitcoin oferecia uma oferta limitada e descentralização, características que o tornavam uma opção interessante. Assim, em agosto de 2020, a empresa anunciou a compra de 21.454 BTC por US$ 250 milhões, pagando um preço médio de US$ 11.863.
## De proteção de tesouraria a identidade corporativa
Após essa primeira compra, a Strategy não parou mais. O que começou como uma tentativa de proteger o caixa da empresa se tornou o coração do modelo de negócios da Strategy. Hoje, ela já acumulou mais de 628.946 BTC, com um valor de mercado impressionante de cerca de US$ 74,7 bilhões.
Inicialmente, as compras eram feitas apenas com o caixa da companhia, mas, antecipando uma grande valorização, Saylor começou a explorar outras formas de aquisição. A empresa passou a emitir dívidas para angariar recursos e, em alguns casos, vender ações para financiar mais compras de Bitcoin. Saylor se referiu a isso como “Bitcoin yield”.
Essas aquisições, geralmente feitas entre 2021 e 2023, foram realizadas com a intenção de beneficiar a empresa a longo prazo. As compras ocorreram em mercados de balcão, minimizando as variações de preço, e os BTCs foram, então, transferidos para carteiras digitais da empresa.
Hoje, a Strategy é vista como uma forma de exposição indireta ao Bitcoin. Antes mesmo da aprovação de ETFs pela SEC em janeiro de 2024, muitas pessoas, inclusive investidores institucionais, começaram a ver as ações da empresa (com ticker MSTR) como um “ETF de Bitcoin não oficial”. Assim, as ações da Strategy tiveram um crescimento expressivo, subindo 2.595% em cinco anos, superando a valorização do próprio Bitcoin, que foi de 905% no mesmo período.
Em fevereiro deste ano, a empresa oficializou um rebranding, mudando seu nome para Strategy, agora com um “B” estilizado.
## Liderando um movimento
Quando a Strategy anunciou que o Bitcoin se tornaria o principal ativo em sua tesouraria, houve ceticismo por parte do mercado, especialmente durante os baixas do mercado nos anos de 2022 e 2023. Apesar disso, Saylor manteve sua confiança e até intensificou suas compras, fazendo da empresa a maior defensora corporativa do ativo.
A resiliência da Strategy, junto com a narrativa construída por Saylor em entrevistas e redes sociais, ajudou a desmistificar a imagem de risco do Bitcoin. Para muitos, uma companhia na Nasdaq assumindo publicamente o Bitcoin como parte central de sua estratégia foi um passo importante, validando a ideia de que o ativo poderia servir como uma reserva de valor corporativa.
Logo, outras empresas, de diferentes setores e tamanhos, começaram a adotar estratégias similares. Exemplos notáveis incluem Metaplanet, Trump Media, SpaceX, Tesla e Mercado Livre. Recentemente, a Méliuz se juntou a essa lista, tornando-se a primeira empresa brasileira a seguir esse caminho.
Atualmente, cerca de 220 empresas, sejam elas de capital aberto ou fechado, têm mais de 1,2 milhão de BTC, representando quase 6% de toda a oferta disponível. A Strategy se destacou nesse cenário, não apenas por ser pioneira na adoção de Bitcoin como reserva corporativa, mas por transformar sua própria identidade e impulsionar um movimento global de aceitação desse ativo.
As empresas descobriram que ativos digitais não são apenas substitutos, mas sim aliados valiosos na diversificação. Quem sabe, com o passar dos anos, olhemos para esse período como um marco no qual as tesourarias começaram a se digitalizar.